A brutalidade policial desconhece partidos
By Gustavo Noronha
Em 2013 eu participei dos protestos de junho. Mais até do que o aumento das passagens, fui protestar contra a violência policial, que tinha sido especialmente brutal em São Paulo. Mas São Paulo infelizmente não foi a única: no Rio de Janeiro a polícia cercou manifestantes que se refugiaram na Quinta da Boa Vista. Chegaram a jogar bombas de gás lacrimogênio lá dentro.
Em Belo Horizonte, em São Paulo, em Salvador, pra todo lado houve protesto e houve violência policial. Até jornalistas foram vítimas: uma repórter da TV Folha levou um tiro de bala de borracha no olho sem estar perto de qualquer vandalismo e sem representar qualquer tipo de ameaça.
Em Porto Alegre, pessoas que tentavam filmar a violência policial acabavam engrossando a estatística das vítimas. No Distrito Federal um policial ficou famoso por justificar violência desnecessária com um singelo “porque eu quis“. Fatos muito parecidos voltaram a acontecer em 2014. Além da violência gratuita, o que relaciona todos esses eventos é o fato de que nada nunca acontece aos policiais que cometem os exageros.
A PM é subordinada aos govenos dos estados. SP e MG eram governadas pelo PSDB, RS e DF pelo PT, o Rio de Janeiro pelo PMDB. Todos os governadores de todos os partidos bancaram as ações de suas polícias, assim como o Governo Federal. Se há alguma coisa que é monopólio de um só partido, a violência policial certamente não é essa coisa.
Mas vemos tentativas constantes de partidarizar essa nossa chaga, como essa aí de cima do antigo Ministro do Esporte, Orlando Silva, do PC do B. Quando a PM do Paraná agiu com violência contra professores que protestavam perto da Assembléia Legislativa, as redes sociais explodiram em denúncias contra o que, segundo os petistas e seus aliados, seria uma característica do PSDB. Mas, ao fazerem isso, nos deram um ótimo exemplo de como a violência é generalizada: usaram fotos de outros eventos como se fossem do Paraná.
A foto acima, por exemplo, usada em vários posts de petistas e aliados como se fosse do Paraná, é na verade de 2011, no Ceará. Nessa época o estado era governado por Cid Gomes, do PROS, que mais tarde foi escolhido para o Ministério da Educação do segundo mandato de Dilma.
Outra foto muito utilizada foi a dessa professora sangrando. Essa foto era de 2015 mesmo, mas não era do Paraná e sim de Goiânia, onde a guarda municipal foi a responsável pelos ataques. A prefeitura é do PT. Apesar dos fortes e louváveis protestos de petistas e seus aliados contra o acontecido no Paraná, a reação deles ao mesmo problema em Goiânia foi o silêncio.
Hoje eles voltam a protestar fortemente (e corretamente) contra a PM paulista, que pode ter cometido uma chacina em represália à morte de um dos seus. Infelizmente preferiram o silêncio quando houve uma chacina sabidamente cometida pela PM na Bahia e o governador, petista, comparou os policiais a artilheiros na cara do gol.
Também recentemente, a PM mineira reprimiu manifestações contra o segundo aumento de passagem de ônibus em menos de um ano. Eu vi gente que chegou a tentar jogar nas costas do prefeito da cidade a responsabilidade, confundindo a PM com a guarda municipal, talvez. Mas não, foi a PM mesmo. Por que tentar jogar pro prefeito? Porque agora o estado é governado pelo PT, não pelo PSDB.
Partidarizar temas que são problemas nacionais e endêmicos é sempre ruim para o debate público. Mas é um grande desrespeito a todas as vítimas da violência policial, muitas delas fatais, desvirtuar o debate numa tentativa de pixar o adversário político.
Cobrar responsabilidade dos governadores e seus partidos sim, devemos sempre fazer, pressioná-los para que assumam seu papel e segurem as rédeas das polícias. O que não dá pra aceitar é a seletividade na tentativa de associar o problema a um partido.
Basta não fechar os olhos e não ser desonesto pra ver que o problema é bem mais geral e o buraco bem mais embaixo. A violência policial desconhece partidos, é geral, um problema do Brasil todo e para o Brasil todo resolver.