O que é preciso pra entender desemprego no Brasil?
By Gustavo Noronha
Somos bombardeados por indicadores relacionados à economia diariamente e fica muitas vezes difícil entender o que eles querem significam de fato. Um que eu acho especialmente complicado é o indicador do desemprego.
Primeiro, porque a metodologia pode não ser muito intuitiva. A taxa de desemprego por exemplo não mede a fração de pessoas que precisa de emprego e não tem, mas sim a fração de pessoas que estão no mercado de trabalho e se encontram desocupadas. Estar no mercado de trabalho significa estar trabalhando ou ter procurado emprego nos últimos 30 dias.
Ou seja não são considerados na estatística: quem está numa situação tão miserável que nem tenta procurar emprego, a pessoa que está recebendo seguro desemprego mas não procurou trabalho, quem arranjou um subemprego pra ter o que comer e parou de procurar trabalho e por aí vai. Dessa perspectiva, nem é tão estranho assim que o uso do seguro-desemprego tenha crescido enquanto a taxa de desemprego caía.
Segundo, porque o Brasil tem atualmente duas importantes pesquisas oficiais que medem a taxa de desocupação. A PME, Pesquisa Mensal de Emprego, é uma pesquisa feita pelo IBGE em 6 grandes regiões metropolitanas brasileiras. Vários estados ficam de fora e o interior dos estados que são contemplados com uma região metropolina também. Isso faz com que a PME seja uma estimativa bastante enviesada.
O IBGE planeja substituir a PME pela PNAD contínua (PNADc). A PNAD é como se fosse uma atualização constante do censo. Ao contrário do censo que visita cada domicílio, a PNAD é feita por amostragem. Mas ao contrário da PME que só enxerga 6 grandes metrópoles, a PNAD chega a mais de 3.500 municípios, conseguindo uma visão bem mais abrangente do que acontece país a fora.
Desde que a PNADc começou ela vem mostrando uma taxa de desemprego maior que aquela vista pela PME. Não por acaso o governo tende a usar sempre os dados da PME. O plano era que a PNADc passasse a ser a única pesquisa utilizada e que a PME deixasse de ser executada a partir de 2015. Com o aumento de desemprego, acho provável que o governo pressione o IBGE a continuar publicando a PME até que os problemas da economia sejam sanados.
Uma semana atrás, no dia do trabalhador, um perfil do governo no Twitter publicou um gráfico comparando a taxa de desemprego do Brasil com outros países com o objetivo de mostrar que apesar do aumento não estava tão ruim.
Comparar taxas de desemprego entre países pode ser uma coisa problemática porque países diferentes podem usar metodologias diferentes. E também porque cada um pode estar numa tragetória diferente. Considere por exemplo os EUA que estão com uma forte recuperação da atividade econômica e vêm tendo uma reduçao do desemprego nos últimos tempos com o Brasil que vai na direção inversa.
O governo, obviamente, escolheu usar o número da PME para sua comparação. Mas o gráfico é bizarro por muito mais que só esse problema: se você prestar atenção vai perceber que os 0,5 entre os 6,4 da Alemanha e os 6,9 da Argentina são maiores no gráfico do que os 1,7 entre os mesmos 6,9 e os 8,6 da Índia. E você aí achando que só a Globo News gosta de usar escalas bizarras pros gráficos, hein?
Nessa quinta dia 7 de maio saíram os dados da PNADc, com uma taxa de desemprego de 7,9%. Com os dados mais confiáveis e abrangentes da PNADc em mãos, resolvi fazer um pequeno exercício: peguei o gráfico do governo, selecionei a área da barra dos 6,9 da Argentina que fica acima dos 6,4 da Alemanha e considerei como 0,5. Daí empilhei até dar os 1,7 que precisa somar aos 6,2% da PME. O resultado:
Dois resultados do exercício: 1) os 7,9 do Brasil ficam bem maiores que os 8,6 da Índia com a escala usada entre Alemanha e Argentina, o que mostra que o gráfico é uma piada de mau gosto; 2) o Brasil não vai lá muito bem nessa comparação.
E, infelizmente, a perspectiva do Brasil não é boa, a expectativa é que o desemprego aumente, basta ver que temos notícias todos os dias de grandes demissões. Esse ano vai ser dureza.