“Com Aécio seria pior”
By Gustavo Noronha
Alguns defensores do governo e do partido do governo, ao se depararem com críticas ao segundo mandato da presidente Dilma costumam contra-argumentar com “Com Aécio seria pior”.
Eu acho que seria muito melhor e explico: em primeiro lugar, teríamos um presidente competente em política, que não estaria cometendo gafes bizarras a cada dia de mandato, como Dilma. A inabilidade política do atual governo é tamanha que conseguiu causar a inversão da relação de forças entre executivo e legislativo, que historicamente pende para o lado do executivo. Inauguramos em Dilma 2 um Parlamentarismo à brasileira.
Segundo, Aécio teria crebilidade. Dilma passou a campanha inteira negando que houvesse problemas, negando que faria tarifaço (que agora chamam de realismo tarifário), negando que aumentaria juros, negando que faria ajuste fiscal. Aécio, ao contrário, passou a campanha inteira chamando atenção aos desequilíbrios da economia e à necessidade de fazer um ajuste fiscal sério para proteger os programas sociais. E Marina também, diga-se.
Em terceiro lugar, Aécio teria um time inteiro comprometido com essa melhoria da gestão e da economia. Nós sabíamos que o Ministro da Fazenda seria Armínio Fraga, que foi professor de Joaquim Levy. Mansueto Almeida, grande conhecedor das contas públicas, provavelmente faria parte da equipe também. Não teríamos Luciano Coutinho tentando esconder os dados das operações financeiras no BNDES, que seria saneado. E assim seria em outros Ministérios importantes, como o do Planejamento. Dilma, ao contrário, tem uma colcha de retalhos com uma ilha de sanidade: Joaquim Levy.
Mas em uma coisa eu concordo com esses defensores do governo: mesmo que Aécio tivesse entrado, nós não escaparíamos desse 2015 difícil que já estamos vivendo, com tarifaço, inflação e juros altos e possivelmente de um 2016 bem fraco, com tudo que vem junto: desemprego, precarização de serviços públicos, queda no investimento. A grande diferença seria a velocidade com que venceríamos essas dificuldades e a qualidade do esforço feito.
Na verdade, do ponto de vista do debate político acho que foi até uma coisa boa Dilma ter ganhado. É bom que seja ela a lidar com os problemas que criou. Até consigo imaginar esses defensores incondicionais dos governos petistas a plenos pumões colocando a culpa no novo presidente por todas as mazelas. Como estão fazendo no DF, destruído pelo petista Agnelo Queiroz, diga-se de passagem.
Mas a verdade é que tudo isso é consequência do primeiro mandato de Dilma. De fato não adiantava ter evitado sua reeleição. Se nós que fizemos campanha contra tivéssemos conseguido, teríamos uma recuperação bem menos dolorida e muito mais rápida, não tenho dúvidas. Mas para evitar que uma recuperação fosse necessária o único jeito era não tê-la eleito em 2010.
E dava pra perceber que isso seria uma boa ideia, bastava prestar atenção no que fazia a Ministra-chefe da Casa Civil Dilma Roussef, no segundo governo Lula. E eu, depois de votar duas vezes em Lula, votei nulo em 2010, porque prestei bastante atenção e não gostei do que vi.
Foi com o aumento da preponderância de Dilma no governo Lula que começou a famigerada política de dar dinheiro público para grandes empresas nacionais via BNDES, com a intenção de formar campeões nacionais que pudessem competir lá fora. A Oi, a JBS e as empreiteiras agradecem. Digo dar porque os empréstimos são subsidiados, ou seja, com juros abaixo do valor de mercado. E a diferença quem paga somos nós, os brasileiros que pagam impostos.
Além disso o BNDES fez bilhões e bilhões em empréstimos subsidiados para aventureiros, como Eike Batista, cujos projetos deram errado e agora não têm como devolver o que receberam emprestado. Um banco que era pra ser “Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social” investindo em negócios de um empresário amigo, sem nenhum retorno social e de altíssimo risco.
E para fazer esses empréstimos, o BNDES pegou recursos emprestados do Tesouro Nacional, que emitiu dívida para bancá-los. Ou seja, aumentamos a dívida que todos os brasileiros pagam às maiores taxas de juros do mundo para emprestar a taxas menores que as de mercado a empresários amigos.
Para piorar a situação, o BNDES se recusa a abrir os detalhes de empréstimos feitos. O presidente do banco, Luciano Coutinho, está inclusive levando multas do TCU por se recusar a dar transparência aos contratos. A Câmara acaba de aprovar emenda do PSDB a uma medida provisória que obriga o BNDES a publicar esses dados. Vamos ver se passa no Senado e se Dilma assina.
Durante os anos 2000 tivemos uma oportunidade única nas nossas mãos. Os ventos internacionais sopravam nos empurrando e chegamos a conseguir fazer superávits bastante acima da meta. Foi um momento em que poderíamos ter reduzido nossa meta de inflação e em decorrência disso as taxas de juros, no médio prazo.
Poderíamos ter feito reformas tributárias que fizessem que os pobres deixassem de ser os que sustentam o Estado, tornando nossa carga tributária progressiva. Com a economia em crescimento sem a necessidade de muita ajuda estatal, poderíamos ter feito um ajuste fiscal de longo prazo, que nos colocasse em outro patamar de poupança doméstica e investimento público, mais compatíveis com os de um país em desenvolvimento.
E veja, foi exatamente isso que os Ministros Palocci e Paulo Bernardo pensaram! Começaram a pensar sobre um ajuste com horizonte de 5 anos. O que fez Dilma? Garantiu que o debate nascesse morto: desautorizou os Ministros e disse que plano de longo prazo não cabe. Disse Dilma (para ver a página ampliada basta criar uma conta, não é necessário assinar):
Esse debate é absolutamente desqualificado, não há autorização do governo para que ele ocorra
Fazer um exercício dentro do meu gabinete e achar que ele será compatível com o nosso país não é consistente. Quando você fala em dez anos, Tem de “combinar com os russos”, que são as 180 milhões de pessoas que vivem no Brasil
Veja bem: tem que “combinar com os russos”, é claro, é óbvio, é ululante. Mas para combinar com os brasileiros tem que antes ter uma proposta pra apresentar. E Dilma já detonou a proposta incipiente antes que ela ganhasse forma. O jeito de pensar da futura presidente está todo aí nessa entrevista: pensar longo prazo é besteira, ajuste fiscal não se debate, o negócio é gastar e, acima de tudo, se quer fazer alguma coisa tem que ter autorização da comandate Dilma. Não viu quem não prestou atenção.
Se a proposta do ajuste fiscal de longo prazo planejado e em tempos de bonança tivesse prosperado, talvez nós não fôssemos hoje forçados a fazer um ajuste recessivo.
A recessão econômica que começa a apontar em Dilma 2 seria inevitável qualquer que fosse o eleito em 2014, isso não se discute. Dava pra eleger alguém que nos tirasse dela mais rápido, o que infelizmente não fizemos. Para evitar que a recessão viesse, só se o Brasil tivesse prestado mais atenção em quem estava elegendo para presidente em 2010. Fica pra próxima.