Ninguém pode negar
By Gustavo Noronha
Há pouco mais de 10 anos eu estava começando num trabalho novo como coordenador de tecnologia. Havia diversos problemas com os serviços de TI que a equipe de então lutava constantemente para resolver. Um dos maiores era um servidor de arquivos, o computador que guardava os arquivos compartilhados por todos os funcionários.
As pessoas viviam reclamando que o acesso era lento, que caía com frequëncia e por aí vai. Perguntei à equipe qual era o problema e me disseram que já tinham colocado 3 placas de rede adicionais no servidor e que tinha mais uma já a caminho, para reforçar a comunicação do servidor com o restante da rede.
O administrador que eu tinha trazido comigo e eu achamos estranho. Ao invés de falar do problema e do diagnóstico falaram da solução. Questionamos: mas vocês tem certeza que o problema é comunicação do servidor com a rede? Cara de interrogação.
Depois de fazermos uma análise do desempenho do servidor descobrimos que o problema da lentidão era o tempo de acesso ao disco que estava muito ruim. Não havia nenhum problema na comunicação com a rede: o servidor não usava sequer 30% da capacidade de uma única placa de rede.
A equipe que estava tentando resolver o problema achava que tinha feito tudo o que podia. O único problema é que tinham errado no diagnóstico e estavam tratando o problema errado. Colocar placas de rede adicionais até pode ser solução pra alguns casos, mas pra esse não ajudava em absolutamente nada. E a equipe não sabia porque sequer tinha informações…
Sempre lembro dessa situação quando vejo Dilma falar de economia. “Fizemos desonerações”, diz ela, como se fosse óbvio que esse é o remédio adequado. Se erraram, diz ela, foi na dosagem das medidas. Como se houvesse uma dose maior ou menor de veneno que faça bem.
“Ninguém pode negar que nós fizemos de tudo para a economia reagir”, disse a presidente hoje. Dá a entender que não havia políticas alternativas que pudessem ser aplicadas com maior sucesso que as que escolheu. Até parece que não houve um coro de economistas chamando atenção para o diagnóstico errado.
Não importa que nada tenha funcionado. Não importa que o investimento tenha caído. Não importa que o mercado de trabalho tenha desacelerado. Não importa que o próprio Ministro da Fazenda da presidenta tenha reconhecido que as desonerações foram uma política cara e ineficiente.
Não importa que isso tenha causado um rombo nas contas públicas que agora nos força a um forte ajuste fiscal. Não importa que na sanha de ajudar indústrias escolhidas a dedo se tenha jogado o setor energético na lama e que a inflação tenha ficado colada no teto da meta, mesmo com preços controlados represados.
Nada disso importa. Dilma não reconhece que errou no diagnóstico e nos remédios. Dilma é infalível e fez tudo o que podia. Se a economia não respondeu, a culpa não é dela.